Comunicado: Posição e propostas da SPF sobre o concurso FCT para projetos científicos

Posição pública da Sociedade Portuguesa de Filosofia sobre o concurso de projetos em todas as Áreas científicas (FCT, 2019-2020), enviada à Fundação para a Ciência e a Tecnologia


A FCT publicou a 6 de novembro os resultados do Concurso de projetos de investigação em todos os domínios científicos aberto em 2019. Nesse concurso foram submetidas e avaliadas 62 candidaturas pelo painel de “Filosofia”. Apenas 3 foram propostas para financiamento. É uma taxa inferior a 5,0%, a mesma em todas as áreas e que corresponde a uma queda muito acentuada relativamente aos c. de 35% financiados no concurso anterior.

Estes resultados e outros elementos do concurso estão a suscitar grande perplexidade e decepção entre a comunidade filosófica, razão pela qual a Direção e o Conselho Científico da Sociedade Portuguesa de Filosofia tomam a iniciativa de solicitar à FCT outra abordagem a estes concursos e sobretudo a correção de situações verificadas em particular no painel de Filosofia e que consideramos lesivas da investigação de qualidade. Por essa razão propomos mudanças que reintroduzam a confiança dos investigadores num procedimento que todos sabemos que é muito competitivo, mas esperamos que seja justo, transparente e robusto do ponto de vista científico.

No plano geral, o financiamento destes concursos carece de reforço, sendo atualmente exíguo para uma comunidade ativa e que cresceu muito nos últimos anos e é incentivada a procurar financiamento para os projetos que queira desenvolver.

Também não parece justificada a opção de maximizar o financiamento dos projetos, sem oferecer modalidades para projetos de diferentes dimensões consoante o financiamento necessário para o seu desenvolvimento, o que permitiria o desenvolvimento de mais projetos. Nesse sentido, seria de utilidade o regresso ao financiamento de projetos exploratórios, por exemplo sem necessidade de contratação de pós-doutorados, que tornaria possível a manutenção em atividade de um maior número de grupos e de investigadores.

Já no caso concreto do painel de Filosofia, verifica-se um equívoco científico injustificado, integrando neste painel os projetos em “História e Filosofia da Ciência e Tecnologia”, que teve como consequência o acolhimento de projetos de “história da ciência e da tecnologia” (que nada têm que ver com Filosofia), acarretando também a atribuição da coordenação do painel de Filosofia a um historiador da ciência e não a um filósofo, como a designação do painel e a grande maioria de candidaturas submetidas fazia esperar. Esse viés introduz um outro: a maioria dos membros do painel trabalham em áreas e com metodologias afins às do Coordenador, ficando de fora quase toda a investigação fundamental em Filosofia e mesmo a investigação em História da Filosofia exterior à chamada “filosofia prática”. Lamentamos que esta dupla situação, que já era visível e comentada no concurso anterior, não tenha sido corrigida e agora tenha sido acentuada.

Tendo auscultado um grande número de participantes neste concurso, vimos propor que a FCT empreenda uma discussão com as Unidades de Investigação e os Departamentos em Filosofia, para a qual também estamos disponíveis, de modo a:

1) Tornar claros os padrões de referência para as su-áreas da Filosofia e a investigação corrente a nível nacional e internacional, que a constituição do painel de avaliação não contempla;
2) Encontrar uma composição equilibrada no plano científico (e mesmo na origem nacional) para a coordenação e para o painel de avaliação, dentro da área que o define: a Filosofia;
3) Autonomizar as sub-áreas que pertencem a outros domínios científicos, separando a “História da Ciência e da Tecnologia” da “Filosofia da Ciência e da Tecnologia (que enquanto tal não precisa de ser individualizada, pois também não o são outras sub-áreas da Filosofia). Sub-áreas de “História da Ciência e da Tecnologia” poderão ser incluídas em cada painel onde sejam relevantes (tal como em Filosofia já está a “História da Filosofia”);
4) Ampliar o financiamento disponível para o próximo concurso;
5) Criar modalidades de projetos exploratórios de modo a manter mais equipas em atividade.

As opções tomadas pela FCT e os resultados até agora anunciados neste concurso têm um forte efeito desincentivador da investigação de qualidade. Tememos pela abrupta interrupção de um trabalho que vem sendo desenvolvido com crescente projeção internacional desde há alguns anos. Não será possível manter este envolvimento dos investigadores com procedimentos que cortam as melhores esperanças, e mesmo a confiança nos procedimentos, com que todos participaram no concurso.

A Sociedade Portuguesa de Filosofia endereçou estas propostas à FCT e fica à disposição para colaborar em todas as iniciativas que se considerem adequadas para encontrar as melhores soluções para superar as situações identificadas.

Lisboa, 19 de novembro de 2020

A Direção da SPFil
José Meirinhos — Presidente (U.Porto)
Magda Costa Carvalho (U.Açores)
João Constâncio (U.NovaLisboa)
António Correia Lopes (CFUL – U.Lisboa)
Aires Almeida (CFUL – U.Lisboa)

O Conselho Científico da SPFil
Álvaro Balsas (U.Católica – Braga)
André Barata (U.BeiraInterior)
António Manuel Martins (U.Coimbra)
João Cardoso Rosas (U.Minho)
João Constâncio (U.NovaLisboa)
José Meirinhos (U.Porto)
Magda Costa Carvalho (U.Açores)
Ricardo Santos (U.Lisboa)
Sofia Miguens (U.Porto)
Viriato Soromenho Marques (U.Lisboa)